domingo, 24 de fevereiro de 2013

HOMILIA DO II DOMINGO DA QUARESMA ANO C

SUBINDO O MONTE TABOR 


Quaresma é tempo de conversão. E converter se é mudar de mentalidade e de atitudes. Assim como quem percebe que errou o caminho, tem de voltar atrás e retomar outra direção. Nisso consiste a penitência, que se traduz em nova maneira de viver a vida.
Com a Campanha da Fraternidade voltada para a Amazônia, ao refletir sobre “nossa vida e missão neste chão”, a Igreja nos convida a uma revisão radical de nossas atitudes com relação à criação e ao meio ambiente. Somos chamados a uma conversão pessoal, mas não só. A humanidade inteira é chamada a uma conversão total. Os estudos sobre aquecimento global comprovam os perigos que nos ameaçam.Enfim a humanidade se dá conta que está tomando um caminho errado que nos levará à destruição. Daí a necessidade urgente de tomar um novo rumo.
Assim aconteceu com Abraão, apresentado na primeira leitura. Deixou sua pátria e partiu em busca de descendência numerosa e terra fértil. A luta não foi fácil, para este patriarca e sua família, mas a fé transformou sua realidade. Deus estabeleceu uma aliança com Abraão. O texto descreve como se fazia esse tipo de contrato. Cortava se algum animal, separavam se as partes e a pessoa passava pelo meio. Com esse gesto assumia o compromisso e o risco de ser cortada ao meio, a própria pessoa, caso não cumprisse o compromisso assumido. Nesta primeira leitura, quem passa pelo meio dos animais cortados é uma tocha de fogo, que representa a passagem do próprio Deus. Significa que Deus assume com Abraão o compromisso “à tua posteridade darei esta terra”. Abraão adere com sua fé. É a contrapartida de seu compromisso na aliança com Deus.
A terra que Deus deu à posteridade de Abraão está desfigurada. A humanidade não cumpriu sua parte no contrato. No lugar da fé, colocou a ganância, a exploração e a destruição. Essa terra necessita ser transformada. As montanhas, sinais de fartura e de beleza, hoje estão deformadas pelos incêndios ou, pior ainda, apinhadas de favelas e inundadas pelo crime. A realidade é de paixão e morte, mas precisa ser transformada em glória e ressurreição.
O Evangelho da transfiguração de Jesus convida a lançar um novo olhar sobre a realidade, para transformá la. Cansado de caminhar pelas estradas poeirentas da Galiléia, Jesus sobe à montanha para orar. Lucas gosta de frisar que Jesus reza, que ele é o modelo do homem em oração. Sobem com ele os três discípulos mais próximos, Pedro, João e Tiago. “Enquanto Jesus orava, o aspecto de seu rosto se alterou, suas vestes tornaram se de fulgurante brancura” (v.29). Nesse fato, os discípulos têm uma pequena amostra da ressurreição de Jesus, uma espécie de aperitivo do que será a glória definitiva. Foi como uma fotografia da presença de Deus na pessoa de Jesus.
Na mesma visão aparecem, conversando lado a lado com Jesus, Moisés e Elias. Os dois representam toda a tradição judaica. Moisés é o representante da Lei e Elias o representante dos Profetas. Temos então o diálogo de Jesus com o Pentateuco e a Profecia, ou seja, com os representantes do Primeiro Testamento ou da Escritura Hebraica. E qual era o assunto da conversa com Moisés e Elias? Falavam do êxodo de Jesus que se consumaria em Jerusalém. Nessa interpretação de Lucas, portanto, a morte de Jesus na cruz não é o fim, mas é o início, ou melhor, a saída, como traduz a palavra êxodo. O evangelista Lucas evita falar de transfiguração, para não confundir seus cristãos, vindos da tradição pagã. Prefere falar de êxodo, uma imagem mais compreensível para todos, devido à importância da saída do Egito para o povo bíblico. Dessa forma, a morte de Jesus é o seu êxodo, ou seja, a sua saída para a glorificação.
Curiosamente a reação dos discípulos é de sono. Quer dizer que eles não estavam entendendo o que se passava. Ainda mais equivocada é a compreensão de Pedro, quando propõe armar três tendas e permanecer no alto da montanha. Faltou entender que para subir, é preciso antes descer da montanha. Que não existe glória sem sofrimento. Que o caminho da ressurreição passa pela cruz. A transfiguração do Tabor só tem sentido se associada com a passagem pelo Calvário. A montanha da glória dá força para a montanha do sofrimento. E ambas estimulam a fé para viver com profundo sentido a realidade. Não é possível permanecer no Tabor, como não é possível parar no Calvário. Tudo aponta para a nova realidade a que somos convidados a viver.
É nesse momento que se manifesta o Pai, presente na nuvem. A nuvem é muitas vezes sinal da presença de Deus, como era o fogo na primeira leitura. Nesta presença se manifesta a voz do Pai que indica Jesus “Este é o meu Filho, o Eleito, ouvi o” (v.35). Os discípulos agora sabem que caminham com Jesus, o filho de Deus. Esse conhecimento lhes causa temor e provoca reação de silêncio. O mistério é grandioso demais. Porém lhes dá fé e coragem.
A segunda leitura reforça o estímulo para esperar com fé e lutar para transformar a realidade. Convida nos a construir a cidade celeste, de onde esperamos o Salvador “que transformará nosso corpo humilhado, conformando o ao seu corpo glorioso” (v.21).

Pe. Marcos Paulo Cestare de Souza

Nenhum comentário:

Postar um comentário